Psicanálise

Desenvolvimento Psicossexual: entenda as 5 fases de Freud

Desenvolvimento Psicossexual: entenda as 5 fases de Freud

Você já ouviu falar que a sexualidade começa na infância? Para a psicanálise, esse é um ponto central. Freud propôs que nossa sexualidade se estrutura ao longo de diferentes fases - da amamentação até a vida adulta - em um processo conhecido como desenvolvimento psicossexual.

Neste artigo, você vai entender o que é esse conceito, quais são as cinco fases propostas por Freud e como ele revolucionou a forma de pensar o desejo, o prazer e o crescimento psíquico desde os primeiros anos de vida.

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O que é o desenvolvimento psicossexual?

Para a psicanálise, o desenvolvimento psicossexual é o processo pelo qual nossa sexualidade vai se estruturando desde a amamentação até a vida adulta. Freud concebeu tal desenvolvimento como uma sucessão de diferentes organizações ou fases:

  • Fase oral
  • Fase anal
  • Fase fálica
  • Fase de latência
  • Fase genital


Freud e a sexualidade infantil

Como professor de psicanálise, costumo dizer que considero a sexualidade infantil a segunda maior descoberta freudiana (a primeira, é óbvio, foi o inconsciente). Tal postulação foi publicada em 1905 nos famosos “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade” e, de fato, chocou a sociedade europeia.

Ora, se dizer que as crianças possuem sexualidade é algo polêmico até para os dias atuais, imaginem só no início do século XX. Óbvio que a sociedade como um todo reagiu com grande assombro a Freud.

Com certeza, afirmar a existência de uma sexualidade infantil significava ir contra toda a tradição que julgava que os prazeres sexuais só nasciam com a chegada da puberdade. E, assim, a psicanálise em muito surpreendeu aqueles que acreditavam na pureza e na inocência das crianças.

Aliás, podemos mesmo dizer que inocentes são os que acreditam nessa pureza infantil, fechando os olhos para coisas que qualquer pai, mãe, educador ou babá percebem facilmente: as crianças possuem prazer sexual.

E que atire a primeira pedra aquele que nunca aguardou ansiosamente para que os adultos fossem todos dormir e deixassem a primalhada sozinha para brincar de “gato mia” ou de “mostra o seu que eu mostro o meu”...rs .

Atenção:

Há um ponto bastante polêmico e que é necessário sublinhar antes de prosseguir em qualquer explanação: dizer que as crianças possuem sexualidade não implica em considerar que um adulto possa delas se aproveitar!

É imprescindível frisar este ponto, pois cada vez mais pessoas ignorantes acusam Freud de “destruidor de famílias” e outras insanidades do tipo. E basta uma simples pesquisa pela internet para percebermos as tantas besteiras que falam por aí sobre a psicanálise.

A sexualidade infantil é um fato: as crianças possuem prazer sexual. Já o pedófilo é um criminoso e deve sofrer as devidas punições previstas pela constituição. E nenhum psicanalista minimamente bem formado passa pano, relativiza ou justifica esta prática horrenda chamada pedofilia.



Desenho de brincadeira gato mia, onde um gato está miando
Ilustração de criança vendada brincando de "gato mia". Fonte: Reprodução

As fases do desenvolvimento psicossexual

Conforme afirmamos, Freud dividiu o processo de desenvolvimento da nossa sexualidade em cinco organizações ou fases: a fase oral, a fase anal, a fase fálica, a fase de latência e, finalmente, a fase genital.

A libido segundo Freud é a nossa energia sexual. Assim, até que atinja a genitalidade (o que ocorre somente ao final da infância e início da puberdade), ela primeiro se estrutura em torno de outras zonas erógenas do corpo, dentre as quais as mais conhecidas são a boca e o ânus.


Portanto, estas cinco fases devem ser compreendidas como campos do investimento da libido em algumas regiões do nosso corpo capazes de nos proporcionar prazer.

Ou seja, quando a pulsão sexual investe predominantemente na região da boca, estamos na fase ou organização oral. Quando a pulsão sexual investe predominantemente na região do ânus, estamos na fase ou organização anal e assim por diante.

Fase oral

Freud considera a fase oral como o primeiro modo de organização de nossa libido. Ela se inicia já durante a amamentação e predomina até mais ou menos o segundo ano de idade. Nela o prazer sexual encontra-se ligado à excitação da mucosa bucal e dos lábios.

Durante este período, é notável o prazer que a criança tem ao sugar o seio da mãe. Posteriormente, ela não hesitará em deslocar tal prazer para uma mamadeira, chupeta ou mesmo partes de seu próprio corpo, como os dedos das mãos e dos pés.

Ela fica chupando tudo, sugando tudo e abocanhando tudo por horas e horas e horas, entregue a um prazer impressionante.

Freud (1905) também escreve que nesta organização oral da nossa libido, a relação de objeto predominante é a de incorporação. Neste sentido, alguns impasses nessa fase podem gerar fixações, sintomas e mesmo conflitos na vida adulta.

Assim, um exemplo de relação adulta baseada na incorporação pode ser o de um amante que, sem o menor respeito pela privacidade e liberdade do parceiro, insiste em “devorá-lo”. Ou então, o caso da mãe que não se conforma com o crescimento do filho e volta e meia tenta “reincorporá-lo” a si própria.

São ilustrações que costumo fornecer em sala de aula e que em muito facilitam o entendimento de como se dá esta estruturação oral da nossa libido.

Ana Maria Braga tomando mamadeira no programa Mais Você
Momento inusitado de Ana Maria Braga tomando mamadeira no programa Mais Você | Fonte: Reprodução

Fase anal

Já a fase anal se inicia mais ou menos durante o segundo ano e vai até o quarto. Nela o prazer está relacionado à excitação da mucosa anal da criança.

Assim, enquanto predomina a organização anal, Freud julga ser bastante comum que, por exemplo, as crianças se recusem obstinadamente a evacuar. Ou seja, elas optam por reter as fezes ao máximo, a fim de que sua acumulação provoque o mais intenso prazer na hora da defecação.

Desta maneira, o ato de evacuar acaba sendo acrescido desta sensação de prazer que a criança geralmente não tem vergonha em reconhecer.

E são muitos os amigos que tenho com filhos pequenos e que se esbaldam de rir com essas situações: algumas destas crianças efetivamente choram ao evacuar porque o cocô foi embora e até mesmo esperneiam quando a descarga é dada.

Lembro também que a minha avó rolava de rir quando contava que um dia chegou no berço do meu tio e viu ele se deliciando com o próprio cocô. E uma colega psicanalista infantil também me contou do constrangimento de, certo dia, abrir a gaveta do banheiro do seu consultório e se deparar com um enorme cocô lá dentro escondido por alguma de suas criancinhas. Menino chorando, olhando para o vaso sanitário ao dar tchau para o cocô

Vídeo que viralizou onde menino chora ao ter que se despedir do cocô em seu desfralde | Fonte: Reprodução

Nesta fase anal, Freud destaca que as relações predominantes são as que envolvem o controle ou não do objeto. E – tal como ocorre no contexto da fase oral – nesta fase anal, alguns impasses também podem gerar fixações, sintomas e mesmo conflitos na vida adulta.

Assim, com exemplo destas relações de controle persistentes pela vida adulta, podemos mencionar o caso de um sujeito que – quando criança adorava controlar a retenção das fezes – e agora passa a controlar os gastos com dinheiro.

De repente, do nada, ele pode ser mesmo capaz de fazer a maior “cagada” gastando tudo o que juntou e sem nem saber como exatamente gastou. Tipo: super rico no dia primeiro e, no dia 2, todo ferrado! Coisas que acontecem comigo, com vocês e com todo mundo...

Fase fálica

A fase fálica vai se estruturando mais ou menos do quarto ao sexto ano. Nela, a libido já se organiza em torno da região genital. No entanto, Freud (1923) destaca que, neste período, as crianças reconhecem apenas um órgão genital: o masculino.

Deste modo, é comum que meninos fiquem assustados ao ver o corpo das meninas: “Elas não o tem”, “Será que o delas ainda vai crescer?”, ou então, “Se há pessoas que não o tem, será que eu posso perder o meu?”. Trata-se, de acordo com esta última pergunta, de entendermos que fase fálica e castração caminham lado a lado.

E também é comum que as meninas construam algumas fantasias por esta época: “Se o meu pai tem, será que ele pode me dar um igual ao dele?”, ou então, “Como minha mãe não o tem, ela é a culpada por não ter me dado um deste”.

Assim, em todo este contexto, as crianças passam a estabelecer relações entre si, perguntando quem o tem e quem não o tem, por que é que uns o possuem e outros não, dentre várias outras questões em torno deste enredo.

E aqui, são também muito comuns as relações de competição e de inveja, valendo frisar que estas tantas competições e invejas se estenderão por toda a vida adulta. Como exemplo, podemos citar o do homem que – quando criança, orgulhoso do seu pênis, o exibia a todo mundo – e hoje vagueia pelas ruas exibindo o seu imenso carrão.

Ou então, o daquela criança que competia com todas para ver quem tinha o pênis maior e, agora crescida, compete com todos para ver quem possui mais dinheiro.

Vale também lembrar que é mais ou menos por esta época que a criança vivencia o famoso complexo de Édipo.

Criança segurando tesoura com personagem do Mickey
Comercial das tesouras do Mickey proibido nos anos 80 porque colocava imagens de crianças com uma tesoura na mão cantando “eu tenho, você não tem, eu tenho, você não tem” | Fonte: Reprodução

Fase de latência

Mais ou menos do sexto ano até o início da puberdade, a sexualidade infantil entra no período de latência. É neste momento que a criança sofre as mais incisivas e necessárias influências da educação e da moralidade. Assim, ela é obrigada a empreender o recalque (em algumas edições da obra de Freud, o termo é mal traduzido por “repressão) de seus desejos sexuais até então bastante intensos.

É também neste período que Freud situa a entrada em cena do trabalho de sublimação. Através dele, a criança vai desviar sua sexualidade para outros domínios, dentre os quais situam-se as manifestações artísticas e a investigação intelectual.

Fase genital

O advento da puberdade marca o fim do período de latência e, com ela, a sexualidade assume sua configuração definitiva. Deste modo, todas as outras zonas erógenas do corpo passam a exercer uma função secundária na vida sexual, passando ela a ser predominantemente genital.

Resumo:

Fase ou organização Idade Relações de objeto predominantes
Fase oral 0 a 2 anos Incorporação
Fase anal 2 a 4 anos Controle
Fase fálica 4 a 6 anos Competição / inveja / exibicionismo
Fase de latência Dos 6 anos até a puberdade Não se aplica
Fase genital Puberdade e vida adulta Não se aplica




Psicanálise e desenvolvimento infantil: questões atuais

Por fim, é necessário marcar que esta teoria do desenvolvimento psicossexual de Freud não é isenta de maiores contradições. Assim, quando costumo ensiná-la, não deixo de tecer a ela algumas importantes críticas.Dentre todas estas críticas, a mais relevante é a respeito da própria utilização do conceito de “desenvolvimento”.

Ou seja, a princípio, há em Freud a ideia de uma espécie de evolução sexual, começando pela oralidade e terminando com a maturação psicossexual, com idades próprias a cada uma das fases elencadas. No entanto, é necessário frisar que a própria formação da subjetividade concebida por Freud é completamente estranha à tal concepção evolutiva.

Ora, não dá para defender que nós possuímos um inconsciente e, ao mesmo tempo, dizer que caminhamos rumo à uma maturação psicossexual. Assim, quem possui um inconsciente será sempre incompleto e, portanto, terá uma sexualidade propriamente inacabada.

E, portanto, não dá para sustentar que há graus mais ou menos desenvolvidos do ponto de vista sexual... Todos possuímos um inconsciente e, deste modo, nenhum de nós chega sequer perto de qualquer ideia referente a uma “sexualidade evoluída” ou a uma “sexualidade bem desenvolvida”.


Perguntas frequentes sobre desenvolvimento psicossexual

O que é o desenvolvimento psicossexual?

Segundo Freud, o desenvolvimento psicossexual é o processo pelo qual nossa sexualidade vai se estruturando desde a amamentação até a vida adulta.

Quais são as 5 fases do desenvolvimento psicossexual?

As cinco fases do desenvolvimento psicossexual propostas por Freud são: fase oral, fase anal, fase fálica, fase de latência e fase genital.



Este texto foi escrito pelo professor Ricardo Salztrager, psicanalista e professor associado da UNIRIO e da Casa do Saber. Possui Graduação em Psicologia, mestrado e doutorado em Teoria Psicanalítica pela UFRJ.

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Referências:

Freud, Sigmund. (1905). Os três ensaios sobre a teoria da sexualidade. In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. vol. 7. Rio de Janeiro: Imago, 1996. p. 117-231.

_______. (1923). A organização genital infantil: uma interpolação na teoria da sexualidade. In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. vol. 19. Rio de Janeiro: Imago, 1996. p. 153-161.

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