Neurociência, Saúde Mental & Comportamento

Mariana Goldfarb fala sobre corpo, saúde mental e autoconhecimento

Mariana Goldfarb fala sobre corpo, saúde mental e autoconhecimento

A trajetória de Mariana Goldfarb vai muito além do universo da moda. Modelo, nutricionista e futura psicóloga, ela construiu sua história entre desafios e superações, enfrentando pressões estéticas, distúrbios alimentares e ambientes abusivos desde a adolescência.

Hoje, compartilha com autenticidade suas reflexões sobre corpo, saúde mental e autoconhecimento, inspirando milhares de mulheres a buscarem equilíbrio em meio às cobranças da sociedade.

Nesta entrevista, Mariana fala sobre sua relação com a imagem, a responsabilidade de influenciar outras mulheres nas redes sociais e como a psicanálise transformou sua vida, tornando-se um caminho de cura e fortalecimento.

Print da entrevista realizada por Isabele Barbosa, jornalista da Casa do Saber, com Mariana Goldfarb, modelo, nutricionista e futura psicóloga
Entrevista conduzida por Isabele Barbosa com Mariana Goldfarb para a Casa do Saber

Pra gente começar, queria que você contasse a sua história. Sei que você começou como modelo, mas muita gente ainda não te conhece. Como foi sua trajetória profissional?

Eu não venho de família influente. Venho de classe média, estudei em bons colégios, mas não os melhores. Vi meu pai desempregado e, desde cedo, comecei a trabalhar: vendia sacolé, miçanga, ajudava em loja no Natal, trabalhava na papelaria da família.

Sempre vi o dinheiro como liberdade e autonomia. Entrei como modelo não por paixão, mas porque tinha os traços estéticos para isso. Comecei aos 13 ou 14 anos. Foi difícil: muita pressão sobre o corpo, manipulação, comentários absurdos como que eu deveria “emagrecer o joelho”.

Tive contato precoce com diuréticos, remédios para emagrecer e ambientes abusivos. Desenvolvi anorexia mais tarde, fruto de um processo que começou muito antes. Eu não sabia impor limites, dizer “não”, e tentava me encaixar em um corpo que não era meu.

E você ainda sente que busca validação desse universo?

Sim. Eu acho que me via muito pelo olhar dos outros. Eu precisava desse olhar para me sentir valorizada, para existir. Isso foi mudando ao longo do tempo, mas ainda não estou imune a isso. Trabalho com imagem, então é inevitável. Procurei respaldo em outras áreas para não depender apenas disso.

Hoje tenho mais equilíbrio, mas ainda é uma preocupação, principalmente porque vivemos em uma sociedade que fomenta a magreza extrema e o uso indiscriminado de remédios novos para emagrecimento. Acho que podem ter função clínica, mas estão sendo usados sem necessidade. Estamos perdendo identidade: todo mundo ficando igual.



“Eu precisava do olhar do outro para existir”



E como você lida com a responsabilidade de influenciar milhares de mulheres nas redes?

No início, eu realmente não tinha noção da minha responsabilidade nas redes. Foi só quando desenvolvi anorexia que percebi o peso do que estava mostrando: um corpo doente, incentivando hábitos nada saudáveis.

Eu recebia uma enxurrada de elogios, “quero ter o seu corpo”, “você é maravilhosa”, e isso é muito sedutor, porque no fundo todo ser humano quer ser amado e aceito. Hoje, tento alinhar fala e ação.

A maioria dos meus seguidores são mulheres mais velhas, entre 35 e 65 anos, e isso também me faz refletir sobre o tipo de referência que quero ser. Procuro falar de maneira responsável, consciente de que cada palavra pode influenciar. Não estou imune à busca por validação, mas me apoio em outras áreas da vida, além da imagem, para não depender apenas do olhar do outro.

Você fez nutrição e agora tem se interessado muito por psicanálise. Essa vontade surgiu da vontade de se entender um pouco mais?

Sim. Vou começar psicologia daqui a duas semanas. Quero seguir todo o caminho até a psicanálise. A psicanálise me salvou de mim mesma. Entrei inicialmente para conseguir me separar, mas descobri que é um estudo sem fim. Hoje sou fã e defendo muito.

E a Casa do Saber tem te ajudado nesse processo?

Eu devoro todas as aulas, adoro os professores. Às vezes escuto tanto que até pego no sono, e no dia seguinte volto pra ouvir de novo. Acho que tenho aprendido muito sobre mim e sobre o mundo.

Também sobre esse inconsciente coletivo que a gente sempre ouve falar, mas não entende direito e que, quando começamos a estudar, faz todo sentido.

A Casa do Saber é super completa nos temas e nos tópicos que traz. É um espaço democrático, que ensina de maneira carinhosa. É técnico, mas, ao mesmo tempo, acolhedor. Eu sou muito fã e recomendo sempre pra todo mundo, porque é um conhecimento que é acessível.

Você fala abertamente sobre distúrbios alimentares. Como você lida com isso hoje?

Não existe cura definitiva. É preciso vigilância constante. Muitas vezes nem é sobre comida, mas sobre outra área da vida que está fora de controle. A gente come as nossas emoções e deixa de comer também.

Então, eu me mantenho atenta: se algo sai do eixo, percebo rapidamente e volto. Uma vez que você teve anorexia, não sei se consegue se dizer completamente curada, mas é possível viver com mais consciência e não deixar a coisa avançar.

Minha virada de chave veio quando percebi a irresponsabilidade de divulgar, nas redes sociais, um corpo doente, mesmo enquanto recebia elogios. Foi duro entender isso, mas foi necessário. Hoje tenho mais saúde porque vivo de maneira mais equilibrada, e também porque busquei respaldo em outras áreas da vida, para não depender apenas da imagem.

Como você faz para não se deixar afetar pela comparação e pela competição nas redes sociais?

Hoje, nem a crítica nem o elogio me afetam tanto. Entendo o meu trabalho como um serviço prestado. Já sofri muito com críticas carregadas de ódio, disfarçadas de “conselho”. Isso machuca, ainda mais sendo mulher no Brasil, um país majoritariamente machista, patriarcal e misógino.

Levantar certas bandeiras nesse contexto é extremamente difícil e muitas vezes os ataques vêm justamente de outras mulheres, o que dói ainda mais, porque além do ataque, vem também a descredibilização.

Apesar disso, sigo entendendo que estamos numa luta constante por mudança de cenário. Há momentos em que sinto retrocesso, mas em outros vejo sinais de esperança, e é essa esperança que escolho cultivar. Mais do que isso, sinto como um dever: pelas experiências que vivi, é meu papel trazer informação dessa forma, mesmo que isso me exponha a ataques.

Quanto à comparação e à competição, já fui uma pessoa muito competitiva, pela natureza do meu trabalho como modelo, por exemplo, e também porque nós, mulheres, somos educadas a competir entre nós: a ser a mais bonita, a melhor. Esse terreno é construído socialmente.

Mas com estudo e análise, comecei a enxergar as outras mulheres de outra maneira. Não é um caminho fácil, mas é possível. Hoje, para lidar com as redes sociais, faço escolhas práticas: paro de seguir, silêncio perfis, filtro os conteúdos aos quais tenho acesso. Seleciono com cuidado o que me agrega e evito o que só gera comparação ou questionamento desnecessário. Afinal, sei que a vida que levo já é desejada por muitas pessoas, e preciso reconhecer esse privilégio para não cair na armadilha de querer estar em um lugar que não é o meu.

Para se aprofundar no tema | Cursos da Casa do Saber:



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