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Sándor Ferenczi

Sándor Ferenczi
Paula Delgado

Sándor Ferenczi: quem foi, principais ideias e contribuições para a psicanálise

Sándor Ferenczi fez parte da primeira geração da psicanálise e é considerado um dos psicanalistas mais originais e inovadores. Ele recebeu a alcunha de enfant terrible (pessoa que se destaca pela irreverência e pelo espírito transgressor) da psicanálise, tamanha era sua ousadia para mergulhar e trazer novas perspectivas para o corpo teórico e clínico do campo.

Ferenczi foi um dos seguidores mais estimados por Freud e era chamado pelo mesmo de “meu amado filho”, apesar das discordâncias entre os dois, uma vez que Ferenczi aprofundou-se em temas que foram deixados em segundo plano por Freud, como o trauma na psicanálise, durante o desenvolvimento de sua obra.



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Sándor Ferenczi antes da psicanálise

Antes de tudo, conhecer as origens de Ferenczi ajuda a compreender a trajetória deste psicanalista tão relevante para a história, apesar de ter sido negligenciado pela academia. Sándor Ferenczi nasceu na Hungria, em 1893, na cidade de Miskolc. Era filho de dois editores, o que fez com que nascesse inserido no universo da cultura Húngara.

Além de seu idioma nativo, o húngaro, ele também falava alemão, francês, latim, grego e inglês. Em 1890, ingressou na Faculdade de Medicina de Viena, a mesma que Freud, e especializou-se em neurologia e neuropatologia.

Entretanto o seu primeiro contato com o pensamento freudiano foi por meio do livro “Sobre mecanismo psíquico dos fenômenos histéricos - comunicação preliminar”. Neste período a psicanálise estava nascendo e Ferenczi bebeu da fonte do primeiro Freud da nova ciência, a psicanálise.

Logo após terminar sua formação em medicina, Ferenczi retornou à Hungria para a cidade de Budapeste, onde viveu quase toda sua vida, e exerceu a profissão desde médico assistente até o exercício da clínica psicanalítica.

Ferenczi também dava significativo valor às causas sociais, uma vez que, para ele, elas auxiliavam na compreensão do sofrimento humano. Com isso, ele se engajou em causas sociais através do atendimento e tratamento médico para pacientes à margem da sociedade na época, como os mais pobres, homossexuais, meretrizes.

Curiosidade: Sándor Ferenczi recebeu este nome em homenagem ao revolucionário húngaro Sándor Petofi, poeta e revolucionário nas jornadas da Primavera dos Povos de 1848.




Freud e Ferenczi: entre acordos e divergências

Posteriormente, em 1908, Freud e Ferenczi têm seu primeiro encontro, o qual foi muito rico profissionalmente e deu origem também a uma amizade pessoal.

Além disso, é importante lembrar que o grupo de analistas que Freud se relacionava, além de ser restrito, era composto por nomes muito conhecidos da época, como Otto Rank, Ernest Jones, que trouxeram grandes contribuições para o campo teórico e prático da psicanálise.

Logo após o seu encontro com Freud, Ferenczi fez uma viagem aos Estados Unidos, em 1909, e apresentou o 1° Ensaio Psicanalítico, no qual ele formulou o conceito de Introjeção, no texto “Transferência e Introjeção”, considerada uma das principais contribuições do autor para a psicanálise.

Ainda que Sándor Ferenczi tenha sido um dos colaboradores mais estimados de Freud, o médico húngaro rompeu com alguns paradigmas já estabelecidos por Freud. Uma destas rupturas foi a irreverência na psicanálise com a ideia da “ética do cuidado” e uma nova perspectiva sobre o papel do analista.

Antes a psicanálise era respaldada na dinâmica da interpretação, onde o paciente entrava em associação livre e o analista, de forma distante, interpretava-o. Entretanto Ferenczi tece uma crítica pontual à ausência de empatia dos psicanalistas, ao passo que defendia que o paciente precisava ser ouvido com mais sensibilidade, com mais empatia e a análise poderia ter mais intervenções do analista, o que chamou de técnica ativa.

Apesar das discordâncias de pensamento entre Freud e Ferenczi, um respeito mútuo entre os dois se manteve ao ponto que Freud convidou-o para proferir o discurso que propôs a criação da Associação Psicanalítica Internacional, no 2° Congresso de Psicanálise de Nuremberg, em 1910.

comite secreto de Sigmund Freud, com a presença de Ferenczi

O “comitê secreto” ou “círculo íntimo” de Sigmund Freud. Freud é o primeiro à esquerda, sentado, e Ferenczi está em pé, à direita. Fonte: Instituto de Psicologia - USP


Pouco depois, em 1912, foi criado um “comitê secreto” formado pelos mais próximos de Freud a fim de transmitir a teoria pura da psicanálise. Alguns dos integrantes que compunham este grupo além de Ferenczi eram Otto Rank, Karl Abraham e Ernest Jones.



Trajetória de produções de Sándor Ferenczi

Em 1919, Ferenczi publicou o texto “A técnica psicanalítica” que aborda a contratransferência, conceito que desenvolve questões sobre a técnica psicanalítica clássica e as necessárias adaptações para que ela se aprimorasse. Com isso, futuramente, ele influenciou o pensamento de outros analistas relevantes, como Melanie Klein.

A relação com estes e outros psicanalistas, assim como entre Freud e Ferenczi, foi muito rica, e proporcionou produções importantes para o campo da psicanálise, como o livro “Inovações na técnica psicanalítica” (1922), de Sándor Ferenczi e Otto Rank.

Tempos depois, em 1928, Ferenczi publica o texto “Elasticidade da técnica psicanalítica “ que trouxe a proposta de uma mudança de postura dos analistas para que eles descessem do degrau do saber e se colocassem mais próximos do paciente e sentindo junto com ele.

“a modéstia do analista não é uma atitude aprendida, mas a expressão da aceitação dos limites do nosso saber” (Ferenczi, 1928/1992, p.31)


Pouco antes do seu falecimento, em 1933, Ferenczi apresentou na Sociedade Psicanalítica de Viena, 1931, a conferência “Análise de crianças com adultos”, um dos principais elementos da sua obra sobre trauma. Neste texto, ele resgatou uma ideia que Freud acabou tirando do fator central de sua obra, a experiência traumática como origem dos sintomas.

Nos anos seguintes Ferenczi desenvolveu outros textos e conferências que complementaram a teoria do trauma, como “A confusão de língua entre os adultos e crianças - a linguagem da ternura e da paixão” (1932), reafirmando a originalidade de suas contribuições para a problemática do trauma na psicanálise.


Teoria de Sándor Ferenczi e principais conceitos

Ferenczi foi um dos discípulos mais criativos e singulares de Freud. Ele elaborou conceitos irreverentes para a época e começou um processo de mudanças na prática tradicional da psicanálise. Algumas de suas principais colaborações para o campo foram:

Teoria ativa:

Uma proposta de modelo clínico no qual o analista assumisse uma postura mais ativa, ou seja, fizesse mais intervenções no processo da análise. A partir disso, para Sándor Ferenczi, seria necessário colocar mais empatia nas interações clínicas rompendo com a proposta freudiana da postura mais passiva e silenciosa.

Elasticidade da técnica:

Conceito que sugere uma abordagem psicanalítica que se adapte às necessidades do paciente e não o contrário. A flexibilidade nas técnicas de análise permite ajustes na postura do analista para favorecer maior acolhimento do paciente.

Transferência e Introjeção:

Apesar do conceito de transferência já ter sido desenvolvido por Freud, Ferenczi trouxe novas perspectivas. Para ele, a transferência não é somente um mecanismo de repetição do passado, mas uma possibilidade para uma reparação emocional. Desta forma a relação entre paciente e analista deveria ser um espaço seguro e de empatia.

Já a introjeção era um mecanismo central do trauma. Ou seja, o processo em que o paciente introjeta os abusos que sofreu e, assim, assume a culpa. Desta forma acredita que merece a violência que passou. Para ele, esse era um processo psíquico de sobrevivência à dor emocional que foi causada.

A relação entre esses dois conceitos, de transferência e introjeção, dá-se a partir do momento em que o paciente pode repetir o padrão de transferência e introjeção na relação com o analista. A partir disso, o foco na dimensão afetiva da psicanálise, a empatia e o acolhimento, seriam fundamentais para ajudar o paciente ressignificar as experiências.

Contratransferência:

Diretamente ligado aos conceitos anteriores, Ferenczi se reavaliou, mostrando seu caráter inquieto que buscava sempre o bem-estar dos pacientes. Em 1925, aprofundou o conceito de contratransferência, reação emocional do analista ao paciente. Portanto, o profissional deveria reconhecer suas próprias respostas emocionais para lidar com as questões do paciente e fortalecer o vínculo terapêutico.

Teoria do Trauma:

Em síntese, a teoria do trauma considera o trauma como um evento real que era mais do que um evento externo, mas também uma questão que afetava emocionalmente o indivíduo. Para Sándor Ferenczi, a confiança era um elemento fundamental para ressignificar a dor e uma análise com empatia e acolhedora seria ideal para restabelecer a saúde do paciente.



Principais obras de Sándor Ferenczi

Ferenczi escreveu diversos artigos, textos que contribuíram de forma expressiva para psicanálise mais humana e empática. Apesar de muitos de seus livros e compilados não terem tradução para o português, conheça as obras que destacam as principais contribuições de Ferenczi para a psicanálise:

  • O diário clínico (1932): Este livro reúne as anotações de Ferenczi sobre experiências terapêuticas, reflexões sobre o trauma e críticas à psicanálise tradicional. Ele aprofunda a relação entre abuso infantil e transtornos psíquicos e discute sua técnica ativa e a importância do afeto na análise. A obra revela seu distanciamento de Freud e sua busca por uma abordagem mais humanizada na psicanálise. Atualmente o livro encontra-se esgotado e sem previsão de disponibilidade.

    capa livro o diario clinico de Sandor Ferenczi

  • Thalassa: um ensaio sobre a Teoria da Genitalidade (1924): Explora a relação entre sexualidade e evolução psíquica. A teoria sugere que o orgasmo simboliza esse retorno temporário. Ferenczi também relaciona traumas infantis à repressão da sexualidade e à formação de neuroses.

    capa do livro Thalassa de Sandor Ferenczi

  • Obras Completas – Psicanálise I, II, III, IV: Este box contempla em 4 volumes traduções de textos ilustres de Ferenczi. Confira o conteúdo de cada volume:
    • Volume I: Textos completos escritos por Ferenczi entre 1908 e 1912, abrangendo alguns clássicos da literatura analítica como "Transferência e introjeção", "Palavras obscenas", "O papel da homossexualidade na patogenia da paranoia", "Sintomas transitórios".
    • Volume II: Obras completas de Ferenczi de 1913 a 1919, abrangendo o período da 1ª Guerra Mundial e da análise de Ferenczi com Freud. Algumas de suas mais importantes contribuições à psicanálise estão presentes, como "O desenvolvimento do sentido da realidade e seus estágios", "Um pequeno homem-galo", "Sintomas transitórios no decorrer de uma psicanálise" e "A técnica psicanalítica".
    • Volume III: Compilado de artigos escritos entre 1919 e 1926, período das experiências técnicas mais famosas de Ferenczi, a chamada "técnica ativa". O volume inclui também o famoso "Thalassa: ensaio sobre a teoria da genitalidade".
    • Volume IV: Conjunto de artigos escritos de 1927 a 1933, ano da morte de Ferenczi. Não foi um período de muitas produções, mas são fundamentais no desenvolvimento das ideias do autor e registram as experiências técnicas de Ferenczi. Essa compilação não inclui o Diário Clínico do autor.


Contribuições de Ferenczi para a psicanálise

Apesar de ter sido “o filho amado” de Freud e todo seu trabalho ter sido muito debatido e transformador no campo da psicanálise, a originalidade e criatividade de Sándor Ferenczi tiveram um preço.

Sua produção fugia do comum e abriu espaço para debates sobre questões da relação psicanalítica e da abordagem mais empática e flexível na análise, na qual não era o paciente que deveria se adequar ao método, mas, sim, o método ser adequado ao paciente, o conceito de elasticidade da técnica.

Com isso, o autor foi marginalizado na comunidade acadêmica em decorrência das suas críticas à psicanálise tradicional que até então era vigente na Associação Internacional de Psicanálise. Isso fez com que Ferenczi fosse colocado nas sombras desde o final de 1920 até a década de 1980. Quando, então, foi resgatado na tradução para o francês de “O Diário clínico” (1932), por Judith Dupont, psicanalista francesa, e fez com que o autor retornasse ao cenário da psicanálise internacional.


A revolução proposta por Sándor Ferenczi demorou um certo tempo para que fosse difundida entre os psicanalistas, porém, na contemporaneidade, Ferenczi vem se mostrando o precursor de muitas das ideias e pensamentos de autores relevantes como, Winnicott, Balint, Searles e outros.

Desse modo, ele solidificou a sua expressividade a partir da proposta de uma psicanálise com mais empatia, humanizada e a importância do vínculo entre analista e paciente.

Atualmente, as contribuições de Ferenczi são amplamente reconhecidas, e muitos de seus conceitos foram incorporados à prática clínica contemporânea e seguem sendo estudados tanto por pessoas interessadas no tema e desejam começar a estudar psicanálisequanto por psicanalistas que lidam com trauma e abuso. Mesmo um século depois, Ferenczi continua atual.

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Referências:

https://curadoria.casadosaber.com.br/cursos/496/sandor-ferenczi-contribuices-a-psicanalise-contemporanea

https://curadoria.casadosaber.com.br/cursos/501/trauma-em-psicanalise-aspectos-teoricos-e-clinicos-em-freud-e-ferenczi

https://youtu.be/OZlJ5LzUsjc?si=LNX4qP4QWChXhtG7

https://www.ip.usp.br/site/noticia/para-conhecer-ferenczi-co-criador-da-psicanalise/

https://www.alsf-chile.org/Indepsi/Publicaciones/Dicionario-do-Pensamento-de-Sandor-Ferenczi.pdf

Mais informações
Nascimento:
1873 – 1933
Escolas
Psicanálise, Escola Húngara de Psicanálise
Abordagem:
Técnica Ativa, Empatia e Afeto na Análise
Épocas:

Perguntas frequentes

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