
Afinal, o que é felicidade? Essa pergunta acompanha a humanidade desde os primeiros registros de pensamento filosófico até os dias atuais. É possível encontrar tantas respostas quanto há pessoas no mundo: cada uma moldada por experiências, crenças e histórias de vida distintas.
Hoje, a busca por essa resposta não é apenas uma inquietação existencial, pois passou a se tornar tema de estudos científicos, livros de autoajuda, memes nas mídias sociais e até debates sobre saúde mental.
Pensando nisso, este artigo te convida a pensar sobre algumas noções do que é felicidade, a partir dos olhares da psicologia, neurociência, filosofia, psicanálise, história e literatura. Além disso, apresentaremos sugestões de leitura para quem quer se aprofundar no tema da felicidade humana.
O artigo abordará os seguintes tópicos:
- O que é felicidade? Uma definição (im)possível
- Felicidade na psicologia: entre afetos e realizações
- A ciência da felicidade: o que dizem os hormônios e os estudos
- A felicidade é subjetiva?
- Felicidade nas redes sociais: filtros, comparações e solidão
- Como ser feliz: caminhos possíveis e realistas
- Perguntas frequentes sobre felicidade
O que é felicidade? Uma definição (im)possível
A tentativa de uma definição de felicidade esbarra, logo de início, em sua natureza mutável. A felicidade pode ser vivida como prazer, satisfação, sentido, realização, calma ou alegria intensa. Além disso, esses sentimentos podem, por vezes, se misturar.
A ideia de que “temos que ser felizes” a qualquer custo, tem se tornado um dos grandes desafios do século. Na sociedade contemporânea, ser feliz se tornou um objetivo de vida, sem necessariamente aprendermos como encontrar as motivações para uma noção de felicidade que está longe de ser plena, mas que precisa ser, sobretudo, possível.
Ser feliz não significa estar sempre bem. Ao contrário, felicidade é saber viver com o que se sente, sem se perder a si.
Para a filosofia clássica, por exemplo, a felicidade é compreendida como um ideal da vida. Na filosofia grega, felicidade era mais do que um sentimento: era o telos, o propósito último da existência humana.
Aristóteles usava o termo eudaimonia, traduzido como “florescimento” ou “vida boa”, para descrever um estado em que a pessoa vive de acordo com a virtude, a razão e a plenitude.
"A felicidade é o sentido e o propósito da vida, o único objetivo e a finalidade da existência humana" (Aristóteles, Ética a Nicômano).
Já os estóicos, como Sêneca e Epicteto, acreditavam que a felicidade viria da aceitação do que não se pode controlar e da prática da liberdade interior. Essa é uma percepção interessante, sobretudo, nos tempos atuais, onde somos estimulados diariamente a sermos produtivos e a darmos conta de tudo.
Nesse sentido, felicidade para a filosofia é sobre viver de maneira coerente com o que se considera valioso.

Felicidade na psicologia: entre afetos e realizações
A psicologia, por sua vez, oferece um outro olhar: para ser feliz, é preciso sentir-se bem, mas não apenas isso.
Martin Seligman, um dos fundadores da Psicologia Positiva, propôs o modelo PERMA (sigla para Emoções Positivas, Engajamento, Relacionamentos Positivos, Propósito e Realizações), mostrando que a felicidade é construída por vários pilares.
Para ele, esses aspectos podem ser trabalhados de modo individual para auxiliar as pessoas a se desenvolver positivamente.
Para entender melhor:
Pilares da felicidade (PERMA) | Características |
---|---|
Emoções Positivas | Pensar positivamente estimula a produção de hormônios que geram bem-estar e satisfação. |
Engajamento | Ter disposição para executar atividades e explorar habilidades também gera foco e bem-estar. |
Relacionamentos Positivos | A capacidade de construir vínculos e uma rede de apoio que seja segura desperta em nós o sentimento de amor, empatia e solidariedade. |
Propósito | Buscar o que nos motiva e que nos impulsiona não apenas profissionalmente, mas também pessoalmente, é uma forma de mobilizar a felicidade em nós. |
Realizações | Celebrar as conquistas e reconhecer os esforços para alcançar as metas pessoais geram uma maior satisfação para com a vida. |
No curso “Ser Feliz é…” Um Olhar Amplo e Diverso Sobre a Felicidade da Casa do Saber, professores e pesquisadores exploram o que significa ser feliz a partir de diferentes perspectivas teóricas.
Entre eles, o psicólogo Lucas Veiga traz uma discussão transdisciplinar da psicologia para se pensar essa ideia de felicidade.
Para ele, aprendemos social e culturalmente que a ideia de felicidade tem a ver com uma vida plena, que na realidade, não existe.
“É comum a gente ter algumas confusões em relação a essa ideia, especialmente quando a gente acredita que a felicidade poderia ser um estado pleno, onde alcançaríamos um determinado lugar sublime, em que não seríamos mais abalados ou afetados por tristezas, mal-estar e outras questões que são próprias da vida.A felicidade, como qualquer outra emoção, ela passa, ela é passageira. - ” (Lucas Veiga, Casa do Saber).
Além disso, o psicólogo convoca a psicanálise para discutir sobre a necessidade humana de descobrir quais são os objetos de satisfação que irão gerar sentimentos de felicidade.
Em outras palavras, na perspectiva psicanalítica, enquanto humanos, precisamos mapear os objetos que podem nos trazer alegria, felicidade e realização - ao contrário dos animais, que são estimulados por um instinto natural.
A ciência da felicidade: o que dizem os hormônios e os estudos
Biologicamente, a felicidade também pode ser mapeada e estimulada. Você já ouviu falar nos “hormônios da felicidade”?
A neurociência nos conta que a dopamina, serotonina, endorfina e ocitocina estão ligadas a sensações diferentes, como prazer, vínculo, motivação e relaxamento, tendo relação direta com o sentimento de felicidade.
- Dopamina: associada à motivação e à satisfação. Tem relação direta com a sensação de prazer e recompensa, além de estar envolvida na regulação do comportamento emocional.
- Serotonina: ligada ao humor estável e ao sono. Em níveis elevados, contribui para um equilíbrio e para a sensação de bem-estar, enquanto baixos níveis podem ser associados a quadros de depressão e ansiedade.
- Endorfina: atua como analgésico natural, reduzindo a percepção de dor e gerando a sensação de prazer e satisfação. É liberada durante a prática de atividades físicas.
- Ocitocina: relacionada ao afeto, confiança e questões sociais. É liberada em momentos de carinho, como durante um abraço ou interação social. Tem relação com a sensação de relaxamento e segurança.

Mas é importante ressaltar que felicidade não vem da excitação constante ou do consumo de estímulos rápidos, e sim do cultivo de virtudes como gratidão, amor e propósito. É o que afirma Arthur Brooks - um dos maiores especialistas em ciência social do mundo - em seu livro From Strength to Strength.
Para o autor, a felicidade está mais relacionada a um amadurecimento do olhar, que reconhece valor na presença, no cuidado, na sabedoria e nos vínculos afetivos.
Nesse sentido, a dopamina, por exemplo, pode nos motivar a conquistar, mas é a conexão com algo maior, como a espiritualidade, a contribuição social ou a criação artística, que sustenta um senso real de contentamento.

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A felicidade é subjetiva?
Sim e não. A felicidade é subjetiva porque nasce da interpretação individual da realidade. No entanto, ela também depende de fatores objetivos como saúde, segurança, vínculos, oportunidades.
Ainda no curso “Ser Feliz É…” , o professor Tanguy Baghdadi chama atenção para os modos como a noção de felicidade também é elaborada socialmente, a partir das experiências individuais e coletivas que geram ou não um bem-estar:
“Mas será que a sociedade não estabelece determinados padrões de felicidade? O que te faz feliz? O que deveria te fazer feliz? Você tem que emagrecer, ir para a academia, tirar boas fotos para colocar no Instagram, conseguir muitos likes... você tem que consumir, ter um carro elétrico, um celular de última geração, você precisa ir para a Torre Eiffel em Paris e tirar uma belíssima foto? Será que isso é uma crítica tão vazia assim? Ou será que, de fato, a gente acaba se sentindo feliz porque aquilo está sendo dito que nos traz felicidade?” (Tanguy Baghdadi, Casa do Saber).
Nesse sentido, para o professor, a sociedade contemporânea constrói modelos normativos de felicidade, frequentemente associados ao consumo, à performance e à visibilidade. Assim, a promessa de felicidade se converte num imperativo moral e econômico, no qual estar feliz se torna quase uma obrigação.
Esse fenômeno foi amplamente analisado por autores como Byung-Chul Han, que descreve a positividade tóxica das sociedades neoliberais em A Sociedade do Cansaço:
"A felicidade, hoje, é uma exigência individual. Cada um é responsável por sua própria alegria ou fracasso. Isso nos isola e nos adoece." - Byung-Chul Han
Separei alguns cursos sobre o tema, caso você queira seguir refletindo sobre felicidade:
- Felicidade, Humor e Riso na História do Pensamento, com Clóvis de Barros Filho
- Amor e Felicidade, com Clóvis de Barros Filho
- Caminhos Possíveis para a Felicidade, com Renato Noguera, Geni Nuñez, Nadja Moraes, Daniel Martins de Barros e Luís Mauro Sá Martino
- A Tal da Felicidade: A Busca de uma Vida mais Plena, com Luiz Hanns
Felicidade nas redes sociais: filtros, comparações e solidão
Na era da comparação constante em que vivemos, as redes sociais vendem uma imagem de felicidade associada a conquistas, estética e a uma positividade tóxica, que afeta diretamente a saúde mental da população.
De acordo com um estudo realizado na Inglaterra em 2020, a exposição contínua a perfis idealizados pode levar ao aumento de sintomas de ansiedade, depressão e baixa autoestima. É como se a felicidade se tornasse um espetáculo: sempre jovem, produtivo, bonito e bem sucedido.
Nessa lógica, quem não performa esse padrão sente que está falhando em ser feliz.
Mas será que é felicidade isso mesmo?
Quando a régua da felicidade é externa, medida por curtidas, seguidores ou pela estética da vida alheia, acabamos por nos afastar do que realmente nos move por dentro.
As redes sociais, ao criarem um palco onde se tornou natural encenar uma felicidade, podem nos fazer esquecer que o sentimento real é mais profundo e mais imperfeito do que qualquer filtro pode mostrar. E que a comparação constante é, muitas vezes, o caminho mais curto para a infelicidade.
A felicidade verdadeira, segundo algumas abordagens trabalhadas na Casa do Saber, nasce do encontro consigo, e não da aprovação do outro. Ela floresce no cuidado com o presente e na construção de um cotidiano possível, e não ideal.
Como ser feliz: caminhos possíveis e realistas
A felicidade não é uma linha de chegada, nem um estado fixo, é um caminho feito de escolhas diárias, sendo possível trilhá-lo com leveza e realismo. Embora não haja uma fórmula mágica, existem práticas que podem ampliar nossa sensação de bem-estar e conexão:
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Cultivar relações significativas:
Amigos, família, comunidades e grupos de apoio são fontes potentes de acolhimento, pertencimento e sentido. A felicidade, nesse aspecto, é também uma experiência a ser compartilhada. -
Encontrar propósito na vida:
Ter clareza sobre o que te move, o que te inspira e por que você faz o que faz pode transformar o cotidiano. Propósito não é necessariamente algo grandioso, podendo ter relação com coisas simples, como ensinar, criar, ouvir, entre outros. -
Cuidar do corpo e da mente:
Alimentação equilibrada, sono reparador, movimento do corpo e psicoterapia não deveriam ser considerados um luxo, pois são pilares de saúde emocional. A ciência da felicidade reforça que o bem-estar está intimamente ligado a esse cuidado integrado. -
Desacelerar e saborear o agora:
Estar presente é uma forma de honrar a vida como ela acontece. Viver o agora, seja numa conversa, numa refeição ou num banho de sol, é um exercício que auxilia a construir uma gentileza consigo mesmo. -
Entenda que a tristeza faz parte da felicidade:
A felicidade não se opõe a tristeza, ela a inclui. Aceitar a tristeza como parte do caminho é um gesto de maturidade emocional. Ela não precisa ser combatida, pelo contrário, precisa ser acolhida, escutada e vivida com respeito e empatia. -
Buscar conhecimento e autoconhecimento:
Estudar, refletir e questionar são exercícios que expandem a percepção do que realmente importa. A filosofia, a arte, a espiritualidade e a psicologia não apenas ensinam, mas também nos ajudam a enxergar com mais profundidade e liberdade quem somos.
“A felicidade é mais sobre o percurso em si, a jornada que a gente tem ao longo da vida, do que a experiência momentânea, talvez de prazer ou de alegria que você tenha em diferentes situações da sua vida” (Ana Carolina Souza, Casa do Saber).
Perguntas frequentes sobre felicidade
O que é felicidade genuína?
Felicidade genuína é aquela que não depende apenas de conquistas e estímulos externos como status social ou likes nas redes, mas nasce de um senso de conexão com a vida. Ela costuma estar associada a relações saudáveis, à presença no agora e ao cultivo de virtudes como gratidão e compaixão.
Como posso saber se estou feliz?
A felicidade nem sempre aparece como euforia. Muitas vezes, ela se manifesta como um silêncio bom, uma sensação de paz ou um contentamento sereno. Pode ser identificada por um estado de satisfação provocado por estímulos internos ou externos.
Quer seguir explorando o que nos faz humanos?
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Referências
https://www.citystgeorges.ac.uk/__data/assets/pdf_file/0005/597209/Parliament-Report-web.pdf